Na sexta feira, dia 19 de junho, por volta da meia noite, eu estava terminando de ler "A Estrada" de Cormack McCarthy, ganhador do Pulitzer de 2007. Aos prantos. Sério.

Não é uma reação que livros normalmente causam em mim. Sou um mega-chorão de cinema, não me contenho e nem quero. Mas em literatura, tudo é mais cerebral, o autor precisa ser hábil demais para me fazer esquecer que estou lendo, mesmo que eu esteja adorando o livro. Mas McCarthy conseguiu.

Comprei o livro após ver o trailer do filme que estréia em outubro (http://www.apple.com/trailers/weinstein/theroad/). Fiquei instantâneamente hipnotizado pelo que sugeria a história. Sou um grande fã de filmes com temática apocalíptica. Gosto muito da ficção que me faz imaginar que tipo de rumo tomaríamos como povo em situações-limite.

Mas o livro é bem mais que isso. Bem mais do que eu esperava que fosse.

Sem querer estragar o prazer de ninguém que resolva comprar o livro, "A Estrada" conta a viagem de um pai e seu filho, do norte ao sul de uma América gravemente atingida por alguma catástrofe que não é explicada em momento algum, mas que também não vem ao caso. Eles precisam sair do frio intenso e buscar a costa, onde o pai espera que o clima seja mais ameno, e aumente suas chances de sobrevivência. Não sobrou nada. Não há comida, nem água, nem animais, e os poucos seres humanos que restaram não são do tipo que alguém gostaria de encontrar.

A estrada em si é um terceiro personagem do livro. Assustadora, cinza, fria, ameaçadora. A cada página ela desafia sua coragem de saber o que repousa na próxima de suas curvas.

Uma maneira de ler o livro é de forma concreta. Como um livro de suspense, e só assim já seria uma obra-prima. Várias passagens me deixaram com calafrios, vários dias fui dormir com pensando no que eu faria naquela situação.

Mas especialmente para quem é pai (ou mãe), e mais ainda para aqueles que (como eu) tem um filho único, o livro é uma experiência devastadora. McCormack esfrega o amor por seu filho em sua cara, ele te deixa com o coração pequeno. Algumas noites, tive que fechar o livro e ir ao quarto do meu filho, abraçá-lo no meio do seu sono. Ter certeza de que ele é real, que está ali, quentinho e a salvo do mundo, debaixo de minhas asas.

A estrada do livro se parece demais com as estradas pelas quais caminhamos todos os dias, enquanto levamos conosco nossos filhos e entes amados. Tentando protegê-los dos perigos, colocando nossos corpos na frente dos tiros. Evitando os contatos errados no percurso. A cada vez que o personagem do livro se vê obrigado a deixar o pequeno menino sozinho e morto de medo à beira da estrada para verificar se há algum perigo à frente, é impossível não se identificar. Quem tem filhos sabe exatamente que mesmo tentando cercá-los de carinho, e cuidado o tempo todo, é inevitável que o mundo se apresente assustadoramente mais cedo ou mais tarde. E o quanto dói vê-los perdendo, pouco a pouco, a inocência e pureza que os faz tão bonitos.

Carregamos nossos filhos cuidando e protegendo-os pelas estradas da vida, torcendo para que, quando chegue o inevitável e temível momento onde eles decidirão seus próprios passos, tenham a sorte, a sabedoria e a vontade de utilizar aquilo que ensinamos, e nos superar nesse trabalho.

"A Estrada" é um livro perturbador e maravilhoso, que me tirou o sono e me desafiou página a página. Foi direto para o topo da minha lista de melhores livros, e não deve sair de lá tão cedo.

Bom, geralmente não faço isso mas esse como o comentário do Vinicius está bem fundamentado, vou abrir exceção aqui, pois ficou muito grande pra área de comments Vou parte a parte, Vinicius, interrompendo-o enquanto comento. A arte da dialética é uma coisa interessante. Você acaba de usar a lógica, a razão, para convencer as pessoas.


Obrigado. Se eu não tentar usar a razão, seria com o quê?

Bem, sou artista plastico, atuando como designer gráfico (sim, posso fazer isso, pois o universo de um curso de artes plasticas é extremamente superior ao de um curso de design), e também formado pela FAAP.

Ótimo, vc é artista plástico. São áreas correlatas. Não vejo nada errado em um artista plástico ser um Designer, nem vice-e-versa. Dizer que o universo de artes plásticas é superior é só seu ponto de vista. Vc vê, eu desenho, e pinto desde que me entendo por gente, mas nunca me intitulei artista, porque tenho muito apreço pela arte, nunca me julguei à altura. Design e arte são coisas diferentes. Correlatas - mas diferentes. Arte (na minha opinião) se faz para satisfazer a SI MESMO, é uma maneira das mais nobres de se expressar. Em design, vc tem que satisfazer ao mercado. Expressar o cliente.

Qual a parte mais importante do corpo? Qual a que tem menos importância? Você vive sem um fígado? Sem um estômago?

Queria só saber o que o corpo humano tem a ver com vida corporativa. Comparação meio pobre, mas vá lá, vc vive sim, sem um dedo.


Sua justificativa é deprimente, talvez seu curso tenho sido em alguns dos botecos ali da Vila Boim, enquanto alguem fazia seus trabalhos.

Pois é Vinicius. Fui bastante nos botecos mesmo. E aprendi muito ali, com amigos que são hoje, grandes profissionais no mercado. Mas fiz minha facu direito. Vc devia saber, pois fomos colegas de classe, até os ultimos semestres, onde vc optou por LEA, não? Não lembra dos meus trabalhos? Eu sempre ficava com a nota só um pouco menor que a do Roberto com o Toshi (o Roberto sim, esse e um cara que eu sempre considerei Artista, bom técnica e conceitualmente). Ninguém NUNCA fez meus trabalhos, muito pelo contrário, eu que ajudei alguns no caminho.


Um dos fatores que fez nossos antepassados deixarem de grunhir e criar formas de sobreviver até hoje, foi organizar suas ideias, seu modo de vida... Lembra das pinturas ruprestes? Representear, denotar, conotar, narrar, ícone, símbolo, use o termo que quiser, aqueles "desenhinhos", tem uma função, e se tem função...

De novo, vc confunde ARTE com DESIGN. Design gráfico é uma necessidade de mercado, não de expressão. Nenhum homem das cavernas desenhou cartão de visitas. Ele se expressou, e isso é arte.

Uma bomba atômica não vai destruir o mundo, o Google não vai virar a Skynet.

Espero que não. Mas se acontecer, eu não vou correr atrás de um designer pra tratar meu filho.

O problema nosso, dos designers são vários. Como ser designers num país onde se chama de "cultura" um evento alcunhado de Carnaval? Pegue um pedaço de pedra na Itália e ela terá mais história para contar que qualquer manifestação acéfala nacional.

De novo Vinicius. O mundo e o ser humano, não vivem sem arte, nisso nós concordamos. E não precisa de diploma pra ser artista, precisa? E vc acha que deveria? Mesmo?


Outro problema, que advém também de uma ignorância de certa forma, são os clientes. Vamos imginar uma situação hipotética, que tanto gosta: Um pequeno empresário, bem sucedido e já ganhando com sua empresa um bom dinheiro, fabrica tênis de excelente qualidade. Um dia ele decide que precisa de um "logo" e te chama. Você estuda a empresa, o público dele, etc, etc, etc. Aí, com uma ideia brilhante, você sintetiza tudo, num elemento aerodinâmico curvo, sugere usar um slogan JUST DO IT e um nome NIKE. Pede o quê, R$ 2000??? O cara te olha e diz: "Estava pensando um valor bem mais em conta, só algo bonitinho pra ir nas caixas." A culpa é do designer?

Se o cara tem uma fabriquinha de sapatos que vira a NIke no futuro, o designer não tem que ser tornar sócio dele porque desenhou o logo. Mas se a Nike me contratar HOJE, eu não vou cobrar só 2 pau dela. Então, cobre corretamente do seu cliente, de acordo com o tamanho dele, a responsabilidade do trabalho, atenda-o soberbamente e, se ele crescer, melhor pra vc, porque vc terá na mão uma conta valiosíssima.


Posso me alongar aqui em milhôes de coisas, a falta de um sindicato ou organização que realmente funcione, desorganização e falta de ética por parte dos designers, submissão por parte dos designers em fazer merda em troca de bom salário.

Concordo. Mas regulamentar não tem a ver com diploma. Repetindo o que falei na lista, Empregadas domésticas são regulamentadas, e não tem diploma.

Não estou desmerecendo outras profissões, acho só que cada macaco no seu galho.

Concordo. Por isso peço para os designers pararem de se comparar com médicos, advogados e engenheiros e criarem suas próprias realidades. E respondendo ao seu último comentário. Reparei no tom agressivo, mas não me ofendeu. Se não quisesse opiniões, não teria aberto um blog. Não me tome por mal, sou extremamente zeloso com minha profissão, quero melhorá-la, mas me cansa quando há tantos anos leio a mesma coisa, sem que ninguém mude de atitude.

Um abraço

Faço parte de uma lista de designers gráficos.

Com a notícia de que não será necessário diploma para exercer a função de jornalista, não demorou para o designers (minha profissão) se sentirem atingidos por tabela, e tecerem comparações. O que postei na lista segue abaixo:

Eu tinha certeza que essa discussão ia chegar aqui.

E minha opinião vai ser completamente diferente da maioria... fazer o que?

Eu acho que não precisa mesmo de diploma. Não precisa. Grandes jornalistas que estão por aí não tem diploma.

E quer saber mais. Também não precisa de diploma para ser designer. E antes que alguém pergunte, sim, sou formado em Design Gráfico pela FAAP, há mais de 12 anos.

Encarem os fatos, Andy Warhol não era designer, mas se ele quisesse fazer uma embalagem pro seu produto, vc recusaria? O que interessa, tanto em Jornalismo quanto em Design Gráfico, é o talento. E ponto.

Mas de modo algum acho que isso desmerece o peso da faculdade... se eu fosse contratar um designer hoje, o diploma teria sim, um peso enorme. Com certeza, o mercado dá valor a quem é formado. O cara que não é formado tem que se provar o triplo. Só que profissionalismo não se aprende em faculdade, não se enganem.

Me desculpem, mas o que falta em nossa área é profissionalismo, não diploma. É saber se portar, saber cobrar, saber dar e cumprir prazo, saber se expressar na frente de um cliente, saber se portar numa reunião. Isso diferencia o profissional MUITO MAIS que um canudo, ou mesmo regulamentação.

E uma coisa que designer tem que aprender, na minha opinião, é PARAR de se comparar a médico, advogado, engenheiro e dentista.
ACORDEM, se cair uma bomba amanhã e a humanidade tiver que se recompor, vamos viver sim, muito tempo sem designer, sem jornalista, sem decorador, mas DE MODO ALGUM, sem médico, dentista, engenheiro, cientista.

A faculdade dessas profissões é NECESSÁRIA porque ninguem aprende a fazer uma safena via tutorial na interner. Um médico passa 10 anos estudando e fazendo residência antes de montar um consultório. Designer faz freela no primeiro ano de facu. Se uma ponte cai, tem lá a assinatura do engenheiro que a projetou. Ninguém liga pro designer as 3 da manhã falando que tá com dor no logotipo. Liga pro dentista.

Essas profissões ganham mais porque tem que ganhar. Porque são essenciais.

Façam um exercício de humildade, saber disso não torna nossa profissão menos necessária no mundo de hoje.

Conforme prometido no último post, passo a publicar o que escrevi para o finado paudabarraca.com.br. Esse foi escrito por volta de 2001. Então não venham me dizer que parece com o Cilada, porque nessa época o Bruno Mazzeo ainda estava no playground, certo?


Uma das coisas imprescindíveis na vida é aprender a se comportar numa mesa. Assim, você poderá esquecer tudo que aprendeu, para saber como se portar numa Churrascaria.
À princípio, parece até fácil. Basta sentar o rabo na cadeira e se empanturrar até não agüentar mais, e ir embora rolando para casa. Engana-se quem pensa assim. Comer em uma Churrascaria requer um nível até avançado de conhecimentos, para que não se coma gato por boi.
Felizmente, o paudabarraca está aqui para ajudá-lo a tirar todas aquelas dúvidas que você nunca teve cara-de-pau de perguntar a ninguém.

1 - Escolhendo uma Churrascaria
Preste bem atenção. Em matéria de Churrascaria, não se deixe guiar pelo nome. Um nome pomposo, com sotaque francês pode ser uma bosta, enquanto "Porcão" é uma maravilha. Existem outros modos de se ter uma pista da qualidade da Churrascaria antes de entrar. O principal deles é o mais óbvio: o preço.
Simples e básico: uma Churrascaria de R$ 35,00 por pessoa é excelente. Uma de R$ 8,90, geralmente, não. Por isso, se seu bolso anda igual ao meu, é melhor ficar na faixa de R$ 12,00 ou R$ 13,00.
Outra forma fácil de identificar quem entende da arte do churrasco é dar uma olhada nos garçons. Todos vão estar devidamente fantasiados de gaúcho. A diferença é que, nas piores, aquele japonês e aquele cearense não enganam ninguém.

2- Entrando na Churrascaria.
Seja duro. Seco. Tudo ali é uma arapuca, pronta para você gastar o máximo, e comer o mínimo.
Se for um final de semana, é muito provável que apareça do nada um garçom com uma infinidade de licorezinhos ditos "para abrir o apetite". Um desavisado poderá achar que aquilo está incluso no preço do rodízio: ledo engano. Tome duas daquelas malditas canequinhas (são sempre bregas:azuis, rosas, com o nome do estabelecimento gravado na frente) e você já terá dobrado o preço do seu churrasco.
Conheço pobres inocentes que chegaram a tomar três ou quatro, e ainda pediram para encher só até a metade, enquanto o garçom vestido de gaúcho ria de uma orelha a outra.
É chegada a hora de conhecer a mesa de frios. Bom, mesa é modo de expressão, porque o a coisa mais parece um chafariz de comida. Ali, tem de tudo. As mulheres adoram.
Pesquise bem o que pegar. Não se empolgue, senão em dois minutos você estará comendo lazanha, e esse não é o seu objetivo nesta noite.
Ao sentar, tenha certeza. Mesmo que você estenda um outdoor vermelho, para a carne não passar ainda, o maldito gaúcho da lingüiça vai querer empurrá-la (no bom sentido) em você. Recuse. Lingüiça, você come em qualquer churrasco do seu sogro.

3- Finalmente, as carnes
Diretiva número 1: não tente conversar.
Você está com a boca cheia, com fiapo de carne no dente, e os gaúchos não vão deixar. É um tal de "chuleta?", "picanha, senhor?", "maminha?". Esqueça. Concentre-se nas carnes. Aceite somente aquilo que você realmente gosta. Não tenha pressa, a churrascaria é grande, tem espaço para todo mundo. Se você for do tipo extrovertido, faça um alongamento de quinze em quinze minutos. Os gerentes não gostam, mas diabos, você tem seus direitos.
Quando voltar a passar só lingüiça, é porque você já está a muito tempo comendo. Está na hora de fazer pedidos.
Chame o gaúcho. Explique o que você quer. Fale da carne como quem fala da Luma de Oliveira. Seduza o cara. Ponha uma nota no bolso dele. Você vai ver. O sujeito vai sair lá do fundo, com aquela picanha sangrando, atravessar o salão inteiro ignorando o povo, e vai direto para sua mesa, oferecer o primeiro pedaço.
É imperativo saber a hora de parar. Preste atenção nos pequenos detalhes. Quando a mesa começar a se afastar sozinha, é um sinal. Veja se não é sua barriga que a está empurrando. Se for apenas um poltergeist, ou um terremoto, continue comendo.


4- Indo embora.
Considerando a orgia alimentar que você acabou de participar, é bom não facilitar as coisas. A tentação de cair no sono ali mesmo será quase irresistível.
Faça alguma coisa à respeito, discretamente. Na saída, finja tropeçar e caia no aquário,ou coisa parecida. Ninguém vai reparar, todos vão estar ocupados, entupindo-se de carne.

Há váááários anos, qdo eu era um dos escritores do saudoso (nem tanto) paudabarraca.com.br, eu montava Guias de Sobrevivências para os tempos modernos. Vou republicá-los aqui, e escrever alguns novos, porque o mundo está cada vez mais complicado, e você, leitor, pode precisar de nossa valorosa ajuda para deslizar calmamente por algumas águas da vida.


O guia de reestréia: Academia.

A maior preocupação do ser humano atualmente é a aparência. Bons tempos aqueles em que uma pessoa era apenas amante de grana, sexo ou poder. Nada disso adianta, se você não estiver bonito.

Os antigos já diziam, a resposta está em Jesus. Sigam seu exemplo.
Isso é verdade. Se Jesus não tivesse um abdomem de tanquinho, Madonna nada teria visto nele, e por consequencia ele não estaria com a vida ganha nessa hora. Então bora puxar ferro.

Chegar em uma academia pela primeira vez é uma experiência assustadora, pra dizer o mínimo. Pelo menos para pessoas ditas normais, como eu. Você olha em volta e aquele povo todo suado, cheio de energia, agitando garrafinhas de conteúdo não-identificado, e pensa: "onde é o bar dessa bagaça". Mas força, porque tá só começando.

Geralmente o instrutor te olha de cima a baixo, e já manda um veredito: "tá querendo perder, né?". Primeiro ponto a aprender: apesar de musculação ser classificado como esporte, o importante numa academia é perder. Competir, só na segunda fase. Isso que ele disse significa que você ficará relegado ao departamento de esteiras, bicicletas e qualquer coisa que normalmente andaria, mas que, em uma academia, fica preso no chão.

O primeiro desconforto numa esteira é ficar ao lado do cara que corre a 40km por hora, por duas horas seguidas, ouvindo um iPod e vendo TV ao mesmo tempo. E você, no começo vai conseguir, no máximo andar por 15 minutos antes de sentir que vai vomitar. E quando passar alguma matéria interessante na TV que não dá pra ouvir, e você fizer menção de escutar, vai pisar na borda da esteira (que veja só, não anda) e dar uma tropeçada absolutamente ridícula, provocando risinhos abafados até no povo que está na lambaeróbica.

A segunda coisa irritante é que você vai começar a suar. Bom, nada demais, dirão alguns. Deixe-me ser claro: você vai suar igual a um cavalo. Sua camisa vai ficar como se tivesse acabado de sair de um lago. Você vai gerar uma poça tão grande que vão perguntar se você é o homem-fluido. Cachoeiras de suor vão descer da sua testa diretamente para dentro do seus olhos.

E se for na bicicleta, além disso tudo, sua bunda vai ficar um trapo no dia seguinte.

Mas você é uma pessoa dedicada, e quer passar pra segunda fase do jogo. Então, dois meses de corre-corre sem sair do lugar depois, você é promovido, e passa à área dos puxa-ferro.

Você vai notar que essa área tem mais espelho que motel. O povo forçudão não consegue praticar nenhum movimento se não estiver prestando atenção em cada veia que sobe no processo. E para você, que ainda está em forma de kibe, o espelho é uma tortura, só presta para te deixar deprimido. O espelho também é usado para que os atletas admirem a forma física de outros atletas sem que pra isso tenham que passar pelo inconveniente de olhá-los nos olhos. Aliás, neste lugar, olho é o que menos importa.

É importante você parecer natural no ambiente, o que é dificil quando se está quase morrendo para levantar cinco quilos ao lado de uma mina que levanta duas toneladas com o glúteo esquerdo, mas tente. As séries geralmente são de 12 movimentos, e você provavelmente vai achar tudo muito fácil até o oitavo. Daí pra frente, seu corpo para de te pertencer, e você é subitamente possuído pelo espírito do Mr. Bean. Na verdade, parece que seu corpo foi substituído por um daqueles bonecos de vento que ficam na porta de concessionárias.

Conheça a fauna das academias. Ela é típica.

O que mais chama atenção, lógico, são os ultra-marombados. Aqueles caras que tem o braço maior que sua cintura. As tatuagens dos caras são em High Definition, wide screen. Eles geralmente são sérios, não estão ali brincando. São profissionais. Me pergunto se eles se dedicassem com este afinco em seus empregos, talvez teríamos um Bill Gates do tamanho do Schwarzenegger.

Tem as gostosas, que geralmente estão lá por motivos: manter aquilo que o cirurgião plástico montou, exibir aquilo que o cirurgião plástico montou e saber o que outros cirurgiões plásticos montaram em outras gostosas.

Tem os homens-balada, que estão lá só para marcar a saída de hoje a noite e para gritar "urrú!" durante a aula de spinning. Esses estão geralmente ultra bem vestidos e tem 4 horas por dia para gastar na academia. Você sempre os vê ao lado de alguém que está malhando.

Os Tiozinhos, que estão ali porque o médico mandou. As gostosas, às vezes, são suas esposas.

E tem você, que espera ficar tão forte quanto os marombados, tomando tanta cachaça quanto os homens-balada e ganhando tanta grana quanto os tiozinhos, só que em 40 minutos, no máximo. Nem preciso dizer que você vai acabar gordo, fraco e pobre.

É a vida.